sexta-feira, 28 de maio de 2010

Coleção

Minhas mais novas aquisições:

1. Mesa-redonda sobre Negros e Negras na Argentina e no Brasil;

2. Palestra sobre a variação da norma padrão do Português do Brasil.

Alguém tem alguma repetida pra trocar?


quinta-feira, 27 de maio de 2010

A pesada consciência do pós-marxismo.

Depois de muito pensar na quinta-feira eu fui para a manifestação contra o aumento da tarifa de ônibus de carro (contradição n1). Quando cheguei lá me lembrei de buscar um documento numa repartição das redondezas antes de ir protestar (contradição n2). Depois de feita a tarefa burocrática eu deixei por precaução o documento no carro, e, por via das dúvidas o, lenço também. Quando, finalmente, me dirigi para o local da manifestação, a manifestação não estava lá. Fiquei aliviado (contradição n3).
Segunda-feira caminhando tranquilamente da casa de um amigo em direção a minha casa, eis que encontro a manifestação no meio do caminho. Engoli seco e passei olhando com o cantinho do olho. (contradição n4).

"Passam os dias, permanece a contradição."

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Fato verídico

... e isolado do resto. Cada post, uma ilha!

Ele estava a toa quando a viu passar. Era uma garota bem arrumada, com passos apressados, postura determinada, uma pasta e alguns livros na mão. E ali, mais ou menos ali, entre a pasta, os livros, os braços cruzados e o ombro coberto, apoiava-se, de cabeça pra baixo, uma vassoura. Era uma imagem curiosa aquela que se projeta e ansiava em passar depressa por ele. Esse objeto desengonçado, o característico utensílio da dona de casa, simplesmente não cabia ali - não se encaixava.
Olhou em torno, para as outras pessoas que matavam seu tempo ao redor, no intervalo das aulas, mas ninguém parecia notar a cena destoante. Será que os outros não prestavam atenção? Ou quem sabe achavam aquilo completamente normal e passível de acontecer em um dia como qualquer outro naquela universidade? Chegou a cogitar se a visão daquela vassoura não era obra de sua imaginação. Enquanto pensava, a garota tomava a direção da direita, entrando no refeitório apinhado de gente. Perdeu-a de vista, então. E agora? Nem lhe houvera tempo para chegar a uma conclusão; para flagrá-la incomodando-se com aquele objeto estorvante; para correr até ela e talvez oferecer-lhe ajuda, como quem não quer nada. Jamais encontraria um porquê. Teve que se conformar: a garota se transformava agora em um bom conto para escrever.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Vontade

Quando criança, a vontade dela era de desbravar o mundo;
na adolescência, a vontade era de encarar o mundo;
na fase adulta ela tem vontade de abraçar o mundo.

Baixinho, ela implora ao tempo:
- Desta vez, por favor, não seja tão fugaz.

"Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades..."

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Ecologia

Um peixe nada na calçada. Não um qualquer: uma carpa. Gorda. Enorme.

Alguém aí tem um balde, de preferência cheio d'água? É preciso afogar o canalha e, assim, salvar o mundo, que gira fora de seus gonzos.

Quimeras

Democracia e liberalismo são mutuamente excludentes.
Enquanto a democracia diz "tu podes, se tu deves", o liberalismo diz "se tu queres, tu podes". E é desse odioso hymeneu que nasceu a política moderna; aliás, um eufemismo para briga de comadres.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Musicologia

Ao pedirem que explicasse um difícil étude, Schumman sentou-se ao piano e o tocou novamente.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Definição

Caridade é exorcizar demônios aposentados.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Colonização

na mais interior geologia,
eivada de sangue
e de ti,
prosperam potosís de alegria.

quanta iniquidade eu já não fiz?
quantos corpos de negros escravos não moí
para fartar as naves imensas
da ganância de ser feliz?

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Alívio copernicano

Eram 15h.
- Bom dia, disse um senhor.
- Bom dia, respondi.
- Bom dia, disse de novo.
- Bom dia, respondi.
- Sim, porque é dia. Não existe “boa tarde”, muito menos “boa noite”. Se tu estiveres na rua a uma da manhã e tu encontrares alguém, tu dirás “bom dia” ou “boa noite”?
- Boa pergunta. O que eu deveria dizer?
- Bom dia. Não existe noite. A terra é redonda. O que existe é sombra. Mas, tenho que ir. Devagar, minhas pernas cansam rápido. Bom dia.
- Bom dia.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Paulinho da Viola

voz transparente
e triste
e quase morta:

porta
de papel de seda,

enciclopédia de papel de seda:

entreaberta,
exala um cheiro:
verbete que a define.

este
verbete:
verbo pequeno
e transparente
e triste
e quase morto.

ser assim é, no entanto, a sua força
— a que cava o leito do rio que passa em nossas vidas:
remotas batucadas.

domingo, 9 de maio de 2010

Qualquer coisa I

A falta de delimitação temática deste blog me causa, também, inquietamento. Parece mais difícil escolher quando a escolha não é feita entre duas, mas entre possibilidades infinitas. Me sinto tão atônito aqui, quanto quando vou ao supermercado comprar um simples shampoo e fico minutos escolhendo entre as infinitas variações do mesmo – acredito que eles embalam a mesma sopinha em plásticos de diferentes cor e tamanho.

Quando a aeromoça de uma viagem de avião – a única que fiz que teve janta – perguntava quase gritando com o sotaque canino dos anglo-saxões “beef or pasta!?”, a escolha era bem mais fácil, era imediata, por impulso, um segundo fazia diferença entre receber a amorfa refeição ou causar a fúria da ex-sex-symbol sexagenária. Eu, rapidamente, percebi qual dos males era o menor.

Aqui no blog a atonicidade frente ao escolher entre infinitos temas é agravada, ainda, pela falta de limite temporal objetivo – claro existe a obrigação semanal de escrever aqui, mas qualquer desculpa é válida para que nos furtemos dela. Esse post que faço agora, está 5 dias atrasado.

De qualquer coisa para qualquer coisa, entretanto, há uma diferença de interpretação. Claro, também, acredito perder o desafio, aquele de escrever sobre qualquer coisa. Porém, tal como quem aceita brincar de associação livre, acredito que ganho aquele outro desafio: o de enunciar a mim mesmo. Ou melhor, adquiro o desafio de suportar a perenidade do texto que escrevo aqui que, ao contrário da fala na associação livre que acaba no exato momento que surge, pode restar eternamente.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

síntese



(em defesa do texto visual)

SAUDADE

Viajar é uma experiência fascinante. Sobretudo, quando no local para o qual você viaja, existem pessoas que falam uma língua irmã à sua. Palavrinhas mágicas vão sendo aprendidas e algumas outras nem se precisam aprender, são iguais.

Há na experiência de conhecer uma nova cultura, um novo povo, um novo idioma, inúmeras vantagens. Uma delas, seguramente, é o aumento da possibilidade de significar as coisas no/do mundo. E quando as coisas do mundo são, especialmente, sentimentos, essa experiência torna-se ainda mais rica.

Maneiras distintas de mensurar o tempo também fazem parte dessa grande experiência. Como alguém pode pensar ou medir o tempo de outra maneira que não aquela que minha língua expressa? Aquela que sempre existiu pra mim? Perco tempo com essas questões...

Afinal, que é o tempo?

A língua que mede aquele tempo, certamente, não poderia originar uma palavra que dá conta do sentimento de querer que este tempo corra depressa.

Ergonomia, Horácio!

Acabo de notar que a tela do computador em que escrevo está assentada sobre uma pilha de livros. Não fui quem que os colocou ali, de modo que só posso especular sobre as intenções de quem o fez.

A motivação principal é, provavelmente, ergonômica: trata-se de, com os livros, elevar a tela até a altura dos olhos do usuário.

Mas isso talvez não explique tudo. Os livros, é preciso acrescentar, são, a rigor, sucessivas edições de uma revista especializada, a Letras Hoje, da PUC do Rio Grande do Sul. Suas capas são todas da mesma cor — verde — e seguem a mesma padronagem. Tudo isso me leva a concluir que a escolha dos volumes foi orientada por um critério estético.

O terceiro motivo, suponho, é epistemológico.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Qualquer coisa

“Escreva sobre qualquer coisa”, foi o que me responderam, depois de feita a temível pergunta “Sobre o que escrever?”. Tomo a resposta ao calcanhar da letra e aceito o desafio de escrever sobre “qualquer coisa”. Primeiro, é preciso suspender qualquer possibilidade metalingüística, pelo simples fato de que não há tal possibilidade. Deus talvez possa falar da língua dos homens, mas, nós mortais temos apenas uma linguagem. Falar metalinguisticamente é falar tautologicamente, i. e. dentro de um mesmo sistema, pois seriam necessárias novas referências para sustentar novos conceitos, e novos conceitos não dispensam a linguagem. Uma formalização não traduzida para uma linguagem ordinária continua a ser apenas uma série de símbolos autológicos: são signo e referência. “Qualquer coisa” é qualquer objeto, mas não é um objeto qualquer. Sua indefinição repousa justamente nos limites do que não pode ser definido, portanto seu limite é a definição. Mas não há termo a esta definição. Abandonamos nossa teoria? Absolutamente não; desde que o termo seja fim, feche uma totalidade. Assim, “qualquer coisa” continua a ser qualquer coisa. Mas, o que? Do que falamos até agora? “Qualquer coisa” é alguma coisa. Sim, mas como se pode falar de alguma coisa indefinida, ou antes, como se pode predicar indefinição de alguma coisa? A indefinição é a negação de uma definição, portanto de alguma coisa. Não pode ser isto ou aquilo outro, mas uma indefinição. Falamos do que não se conhece? Mas como se pode falar do que não se conhece? Se a linguagem permite que se cometa tal absurdo lógico, então existe outros interpostos pelos quais passa que não apenas signo e referência, já que se fala de algo pro qual não há referência. Ou, acaso pode-se apontar para "qualquer coisa"? Não, pois mesmo que se pudesse, ao apontar para "qualquer coisa", “qualquer coisa” deixa de ser o que é para ser qualquer coisa apontada. O ato de apontar dá um contorno para “qualquer coisa”. Há, no entanto, um uso de “qualquer coisa” que talvez possa lançar objeções ao que se disse: quando alguém diz, “Escolha alguma coisa”, “Mas o que?”, “Bem, qualquer coisa!” Nesse caso “qualquer coisa” se define por alguma coisa de um conjunto de coisas que estão em um lugar, e este é o máximo a que definição pode chegar. Há um termo para ela. Como se vê, este não é o caso. Se a linguagem permite falar de algo pro qual não há referência, então não faz sentido falar em termos metalingüísticos, pois ela, por si só, já ultrapassa o âmbito dos objetos; visto que a linguagem não é um simples apontar para eles, como queriam os gênios inventores do mundo de Gulliver, falar metalingüisticamente é fazer meta-metalinguagem; é objetificar algo que já é capaz de criar objetos, e que, por isso, possibilita que haja metalinguagem. Entretanto, do que fala a metalinguagem? Tudo se torna um imenso jogo de espelhos. Não se pode falar de um objeto objetivamente."Qualquer coisa" é um objeto da linguagem, mas não do mundo. Só podemos falar de “qualquer coisa”, porque não temos o mundo. E perco o desafio, se desde o início (não) falei de nada.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Cinema


De 11 a 18 de maio, um mês antes do 14º FAM, a organização do festival, em parceria com cineclubes locais, preparou uma mostra itinerante com os filmes ganhadores do Troféu Panvision da edição de 2009, nas categorias Curtas Mercosul 35 mm, Vídeos e Infanto-Juvenil. Na programação estão produções que receberam diversos prêmios, como Os filmes que não fiz, de Gilberto Scarpa, de Minas Gerais, o melhor curta-metragem, e o catarinense Ângelo, o coveiro, de Renato Turnes, melhor vídeo do festival.



o texto

Parece que no nosso mundo (acadêmico) tudo é o texto.
Não passa por ele. Não é por meio dele. Simplesmente é o texto.

Hoje defendi o texto.
O texto como entidade.
O texto como detentor da ideia. Detentor do homem, da essência.
O texto como caracteres bem postos, cheios de si.

Por que devo me importar com o número de exclamações ou as reticências?

O texto que me trai. O texto que não domino. O texto que não entendo.
Mas é o texto que cada vez torna-se o nós.

Estavam dois bolsistas como os dois pinguins de uma tira da revista Piauí.
Cada um em seu computador, lado a lado, e um bolsista perguntou para o outro "você viu o que eu twitei?". O outro responde "agora estou fazendo um scrap, já te respondo". Os pinguis eram blogueiros, os bolsistas eram pessoas de seu tempo, comunicando-se como todos os outros. A piada se perde, pois é apenas o mundo normal.

Será que este é o mesmo texto que defendi hoje?
Será que este é o mesmo texto que cobram tantas vezes por sua "falta" de domínio?

E se o texto torna-se o nós, como podemos ter o texto tão frágil?
Que nós somos?

terça-feira, 4 de maio de 2010

Por trás das letras

"Se você não gosta de poesias, não leia". Essa foi uma frase dita por um professor aos alunos durante uma aula. Tenho dúvidas se ele tentou aguçar a curiosidade ou desestimular de vez aqueles que não gostam desse gênero literário.
Não farei críticas ao que foi dito apenas deixarei reflexões:
Você leria poesia se não gostasse?
Quantas vezes você leu algo que não gostou e mais tarde teve descobertas agradáveis através dessa leitura?
Em meu humilde ponto de vista, sou a favor do incentivo a qualquer gênero literário. Poesia é um dos gêneros literários que mais aprecio, então sou suspeita, mas na verdade só pretendo deixar um relato sobre uma leitura que não apreciei muito e após tê-la concluído descobri algo mais: a beleza na arte de Honoré Daumier.
Mesmo não sendo uma expert em artes plásticas ou artes visuais, como preferirem denominar, ainda posso ter o prazer de apreciá-las e ver além do desenho a intertextualidade presente na obra do pintor. E isso eu só pude perceber após ler o clássico Dom Quixote.
Confesso novamente: não gostei. Somente após ter feito uma apresentação sobre a obra, em que eu precisei relacioná-la à pintura, que passei a gostar. Apresentei à classe Honoré Daumier, um dos pintores que representou Dom Quixote de maneira peculiar. Muitos outros renomados pintores retrataram "o cavaleiro de triste figura", no entanto, Daumier inovou na cor e na luz de sua pintura dando a ela um aspecto aéreo e disforme, o que caracterizava muito o nosso herói/anti-herói Dom Quixote. Além disso, Daumier retratou muito do personagem idealista e sonhador que havia nele mesmo. O pintor emocionou- me e repensei a obra literária.
Talvez um dia eu até possa dizer a algumas pessoas para não lerem romances, epopéias, poesias, ou qualquer outro gênero que elas não apreciam, porém, meu discurso será outro: "Não leiam se não gostam de tal gênero, mas vocês não saberão o que poderiam ter encontrado (ou não) nessa leitura".